domingo, 12 de fevereiro de 2017

Filmes da Índia

Mês passado no CCBB RJ houve a mostra Novo Cinema indiano com curadoria de Shankar Mohan e Carina Bini. Todas as sessões lotaram, sendo inexplicável não serem lançados no circuito comercial. Não vi todos os filmes, mas gostei de todos que vi. Seguem as impressões que me deixaram:
CINEMAWALA
Dir.: Kaushik Ganguly/2015/105min
Uma homenagem aos filmes em película, aos cinemas antigos e o conflito de gerações. Sem ser maçante também mostra a questão ética totalmente ligada à estética. Um elenco excelente! Deu saudade do volume e textura das películas, ainda não há isso no digital.

ILHA DE MUNROE
(Mundro Thuruth)
Dir.: Manu/2015/92min
Primeiro filme desse diretor, começou muito bem! Um drama com elenco fascinante em uma ilha paradisíaca, a história simples de um pai que leva o filho delinquente para passar uns dias com o avô ingênuo que pensa em tratar o neto adolescente com a medicina tradicional da Índia. O jovem rejeita os usos e costumes do avô, prefere refrigeramte e Kit-kat. O conflito que no começo parece tragicômico descamba para a tragédia. E não é isso que acontece quando a Cultura de um povo é destruída?

GERAGALU
Dir.: Nikhil Manjoo/2015/90min
Achei o mais fraco e como a foto da divulgação mostrava o ator caracterizado para Yakshagana, a expectativa era de ver mais dança e a representação: as poucas cenas são lindas. Há erro de continuidade em uma cena e uma cena engraçada com a foto do Papa Francisco. O resto é a questão do ego enorme e o neto do ator chega para salvá-lo da auto-destruição.

O OVO DO CORVO
(Kaaka Muttai)
Dir.: M. Manikandan/2014/109
Filmes onde há crianças costumam ser sempre bons, mas esse é muito mais que isso. Os dois atores mirim trabalham melhor que muita gente grande. A miséria de lá é nossa conhecida antiga por isso não causa espanto. E toda a saga para provar pela primeira vez na vida uma pizza seria surreal se não fosse tão comum. Um filme inesquecível!

O FAZEDOR DE CAIXÃO
(The Coffin Maker)
Dir.: Veena Bakshi/2013/123min
A diretora veio do mundo da publicidade, logo o filme tem as marcas desse defeito. Porém, além de filmado em uma aldeia de Goa, possui um humor e mesmo a cena de um jogo de xadrez entre a morte e Anton, inspirado em Bergman que se inspirou em uma pintura de uma igreja, consegue fugir dos estereótipos: o jovem que faz a morte é um galã. E o herói Anton é um homem desesperançado. E o tema dos desejos e ausência deles está sempre atual.

PUNHALADA NO CORAÇÃO
(Katyar Kaljat Ghusali)
Dir.: Subodh Bhave/2015/161min
O único filme de Bolywood, longo e eletrizante do começo ao fim. A questão da garganta de onde sai a voz estar localizada entre o coração e o cérebro é mostrada com cantos de uma beleza exótica, com vozes belíssimas e o drama exagerado que lembra as novelas mexicanas, às vezes dando o efeito contrário , em vez de lágrimas, risos, de tão exagerado. Mas em um país como o nosso onde o EGO de certos cantores é maior que a voz e o talento, foi inevitável a comparação. Filme aplaudido no final.

QUE ASSIM SEJA
(ASTU)
Dir.: Sumitra Bhave e Sunil Sukhtankar/2014/135min
Esse filme deveria passar em circuito urgente! É sobre o Alzheimer, as consequências e os conflitos que causa, sem deixar de ir além: mostra que memória e esquecimento são entremeados por mal entendidos e reações que vão além de saúde e doença, tempo passado e futuro, tocando em sentimentos como afeto e solidariedade que são atemporais e imemoriais. A cena mais bonita e foi usada na divulgação é do velho, a criança e a elefante deitada, todos dormindo o sono tranquilo dos inocentes.


sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Micro-Ditos

Os  Micro-ditos são frases, poemetos, aforismos, etc.

1- longe depende do ponto de vista e perto também/ mas a distância existe e o planeta é único e enorme/ e nós tão desconformes


2-seguir metas é quase impossível: a vida é tão cheia de atalhos e sentidos/ e pessoas decisivas


3-o Sol é espetacular/tanta luz e calor/ embora ninguém o adore mais como a um deus/ ele continua a iluminar


4-correr linhas sobre superfícies e dar vida aos mais simples traços/ eis o desenho de fato



5-Há algo surreal ou hilário em ser brasileiro/ o resto é inventado/ papo furado de forasteiro

Crítica de Cinema


Uma  das  críticas  que  mais  gostei de  escrever foi essa  sobre  o  filme  As 14 Estações  de Maria, saiu no  Blog  Cinema  na Veia.

14 Estações de Maria (Kreuzweg) Alemanha - Cor, 110min - 2014

A Bíblia, que levou milhares de  anos  sendo escrita e é considerada por bilhões de pessoas como palavra de Deus, já inspirou grandes obras de arte.
Este filme alemão do diretor Dietrich Brüggemann, mostra o martírio de uma adolescente cristã,Maria( Lea Van Acken, excelente atuação) seguidora de uma linha ultra-conservadora que  não aprova o Concílio Vaticano II, ainda reza missa em latim, continua com as mesmas práticas medievais, e terminam alçando o demônio que juram combater a protagonista esquecendo do Amor que Cristo pregava.
A peversidade da mãe(Franziska Weisz) é tão bem exibida que há um gozo sádico nas expressões da ótima atriz. O pai é de uma passividade revoltante. Dos três irmãos menores, o mais novo de quatro anos se recusa a falar e essa "doença" será o catalisador que Maria encontra pra sua fuga rumo ao Paraíso.
A empregada Bernadette(Lucie Aron) estrangeira que fala mal o alemão,  é admirada por Maria por ser madura, ou seja, normal!
E o doce amiguinho da escola,Christian(Moritz Knapp), -- que achei que poderia  ter um nome mais "satânico", Lucious , ou contestador Jörg Mario por exemplo, já que ele canta Gospel e Soul, além do divino Bach, no Coral -- é uma tentação de carne e osso e vida prosaica, bom demais pra permitido na lógica insana deles.
A cena dos colegas de escola põe a questão da tolerância en passant. O que é tolerância? Qual o limite da liberdade e autoridade se houver risco à vida?
Completamente enredada na lavagem cerebral dos fanáticos, Maria segue as 14 Estações de Cristo que são intertítulos do filme, na mesma via crucis sadomasoquista, mas em pleno século XXI.
É um filme para estômagos fortes, com câmera parada que lembra Kenji Mizogushi (também no sofrimento);  talvez fosse melhor classificado commo filme de terror! O esvaimento  do corpo anoréxico de Maria é um pálido reflexo do que aconteceu com a mente dela.
Alguém desavisado poderia considerar uma ficção absurda, inexistente. Mas , por incrível coincidência, há poucos dias houve em Nova Friburgo o encontro de um grupo Católico ultra conservador que se rebela contra o Papa Francisco, nega o holocausto, e educam crianças da mesma forma vista no filme.
Talvez a passagem do politeísmo onde os deuses tinham qualidades  humanas para o monoteísmo tenha afastado demais certas pessoas peversas das maravilhosas qualidades terrenas, entre as quais, tomar sorvete. cantar em coral e fazer bons filmes como este!

Caligrafia, minha pintura da série de nankim e aquarela